Como o esquema operava
Crédito tributário de ICMS
Empresas como Ultrafarma e Fast Shop tinham direito a pedir ressarcimento de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) quando pagavam imposto em excesso, mas esse processo é burocrático e demorado.
Auditor fiscal como “cérebro”
O auditor estadual Artur Gomes da Silva Neto, funcionário da Sefaz-SP, atuava diretamente nesse processo. Ele acelerava a liberação dos créditos — em prazos reduzidos, sem revisão e até autorizando valores além do devido.
Empresa de fachada
Para receber as propinas, Artur criou a empresa “Smart Tax Consultoria”, registrada no nome de sua mãe. Até meados de 2021, essa empresa era inativa. Mas a partir do segundo semestre daquele ano, passou a receber pagamentos milionários da Fast Shop e Ultrafarma — mais de R$ 1 bilhão entre 2021 e 2023.
Certificado digital
O auditor chegou a usar o certificado digital da Ultrafarma para protocolar pedidos diretamente no sistema da Sefaz, integrando-se perfeitamente ao mecanismo de fraude.
Propinas em troca de facilidades
Em troca, Artur recebia grandes somas via Smart Tax (empresa de fachada) — enriquecendo estrondosamente sua família, já que a mãe viu seu patrimônio saltar de cerca de R$ 400 mil para R$ 2 bilhões em apenas dois anos.
O que garantiu o sucesso do esquema
Controle direto do auditor: ele fazia todo o processo — do pedido à liberação dos créditos — de dentro da Sefaz, sem passar por controles internos.
Empresa de fachada para lavagem legal: a Smart Tax emitia notas, recebia os recursos, e fazia repasses por fora.
Atuação contínua: o esquema funcionou desde meados de 2021 até a operação desta terça, movimentando mais de R$ 1 bilhão em propinas.
Por que a prisão chegou agora
A investigação avançou após a quebra de sigilo fiscal e telemático do auditor. E-mails internos mostraram claramente a coordenação do esquema
A prisão foi considerada urgente por causa do risco de influência sobre depoimentos e possível fuga, já que os investigados eram financeiramente influentes.
COMO O ESQUEMA FOI DESCOBERTO
1. Movimentações financeiras incompatíveis
O auditor fiscal Artur Gomes da Silva Neto, funcionário da Sefaz-SP, começou a chamar atenção por movimentações financeiras muito acima da sua renda oficial.
Sua mãe, dona da empresa de fachada Smart Tax, também passou a ter crescimento patrimonial explosivo: de cerca de R$ 400 mil para R$ 2 bilhões em dois anos.
Isso despertou suspeitas de lavagem de dinheiro e enriquecimento ilícito.
2. Denúncias e alertas internos
Fontes internas da Secretaria da Fazenda podem ter alertado sobre irregularidades nos processos de liberação de créditos de ICMS, como:
Processos tramitando rápido demais;
Créditos aprovados sem análise técnica completa;
Repetição dos mesmos erros favorecendo as mesmas empresas (Ultrafarma, Fast Shop etc.).
3. Quebra de sigilo bancário, fiscal e telemático
O MP obteve autorização judicial para:
- Quebrar o sigilo fiscal e bancário de Artur, da Smart Tax e de envolvidos.
- Acessar e-mails, mensagens e registros no sistema da Sefaz-SP.
- Foi aí que evidências diretas apareceram, como:
- E-mails trocados entre Artur e empresas como a Ultrafarma;
- Uso do certificado digital da Ultrafarma pelo próprio auditor para protocolar pedidos;
- Notas fiscais frias emitidas pela Smart Tax em troca dos "serviços".
4. Rastreamento dos pagamentos e notas frias
Descobriu-se que empresas como Ultrafarma e Fast Shop estavam pagando a Smart Tax valores milionários.
A Smart Tax, no papel, prestava “consultoria tributária”. Mas:
Não havia estrutura para isso;
Era registrada em nome da mãe do auditor;
Só começou a operar depois que o esquema começou (2021).
5. Aprovação anormal de créditos de ICMS
A Sefaz tem rotinas internas que registram quem aprovou cada crédito tributário.
Foi constatado que o próprio auditor Artur aprovava os pedidos que ele mesmo inseria no sistema, o que é totalmente irregular.
Além disso, empresas ligadas ao esquema sempre tinham aprovação muito mais rápida e com valores maiores do que outras na mesma situação.
6. Interceptações e gravações
Em alguns casos, o MP coletou conversas interceptadas e gravações que mostravam:
Coordenação entre Artur e os empresários;
Indicações de propina disfarçada de pagamento por “consultoria”;
Instruções para evitar fiscalização ou disfarçar os repasses.
Resultado: Operação Ícaro
Com todas essas provas, o MP-SP, com apoio da Receita Estadual e da Polícia Civil, deflagrou a Operação Ícaro, em 12 de agosto de 2025.
Foram cumpridos mandados de prisão, busca e apreensão, levando à prisão temporária de Sidney Oliveira, Artur Gomes e outros envolvidos.