O transtorno alimentar restritivo evitativo (TARE) é um transtorno caracterizado por alterações graves no comportamento alimentar, como restrição alimentar (diminuição da quantidade de comida ingerida) e/ou evitação (pouca variedade de alimentos) que levam ao comprometimento físico e/ou estresse psicossocial dos pacientes.
“Ocorre principalmente em crianças que têm refeições difíceis e conflituosas. Elas costumam apresentar baixo peso, prejuízo no crescimento, comprometimento clínico, deficiência de micronutrientes, e podem necessitar de suplementação alimentar ou alimentação via sonda enteral para manter o estado nutricional saudável”, explica Mireille Almeida, psiquiatra especialista em transtornos alimentares da Clínica Unitrata, professora da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo (FCMSC/SP) e membro da Associação Brasileira de Transtornos Alimentares (Astral/BR).
Segundo a médica, trata-se de um transtorno com causas multifatoriais, envolvendo aspectos genéticos e ambientais. “Alguns fatores relacionados que já foram identificados: presença de outros transtornos, como o transtorno do espectro autista (TEA), história de transtorno alimentar na família, ou experiências traumáticas prévias envolvendo alimentação, como engasgo, vômito, sufocamento”, afirma.
Como o transtorno alimentar restritivo evitativo se apresenta
Segundo Mariana Queiroz Martins Pedroso, psicóloga colaboradora do Programa de Tratamento de Transtornos Alimentares (Ambulim) e do Programa de Atendimento, Ensino e Pesquisa em Transtornos Alimentares na Infância e Adolescência (Protad) do Instituto de Psiquiatria da USP (IPq/HCFMUSP), o TARE pode ter três apresentações típicas de sintomas. Em geral o paciente:
Evita comer baseado em questões sensoriais, como cheiro, cor e textura dos alimentos;
Tem falta de interesse nos alimentos, enxergando o ato de comer como uma obrigação ou como algo não tão interessante;
Apresenta histórico de traumas relacionados à situações alimentares, como, por exemplo, engasgar com uma espinha de peixe ou vomitar após comer algo estragado.
Além do baixo peso, prejuízo no crescimento e deficiência nutricional, o transtorno também pode causar diminuição do ritmo cardíaco, ausência de menstruação, perda muscular e prejuízos psicossociais, como ansiedade, apatia, depressão, dificuldade de concentração, irritabilidade e isolamento social.
Complicações associadas ao TARE
Pacientes com o transtorno alimentar restritivo evitativo podem ter complicações de saúde relacionadas à desnutrição causada pela restrição e evitação de alimentos. De acordo com a dra. Mireille, esse déficit nutricional e energético compromete o bom funcionamento dos órgãos e pode, inclusive, impactar no crescimento adequado.
O TARE em geral surge na primeira infância, até os 6 anos de idade. “À medida que a demanda energética aumenta, com o avançar da idade, as dificuldades alimentares tendem a aumentar os prejuízos na saúde física e no crescimento”, diz a médica.
“As deficiências nutricionais podem acarretar problemas graves de saúde, como baixa imunidade, osteoporose, fadiga e alterações metabólicas, além de doenças gastrointestinais crônicas como constipação, distensão abdominal e risco de morte por desnutrição. Além disso, há muito prejuízo da parte social, com o paciente não conseguindo muitas vezes comer usualmente na escola, com os amigos, ir em festas de aniversário, viagens, entre outros contextos sociais”, afirma Mariana.
O transtorno também pode ser estigmatizante, por ser difícil de ser identificado, principalmente nos casos em que não há um impacto severo na saúde física e na qualidade de vida do paciente. “Muitas dessas crianças são estigmatizadas como se fossem ‘birrentas no comer’ e esse estigma afasta os pais da procura por ajuda, acreditando que isso é algo da personalidade da criança e não uma doença. Por isso, a consciência é muito baixa tanto do paciente como dos pais”, explica a psicóloga.
O transtorno pode perdurar até a fase adulta, especialmente nos casos em que não há tratamento adequado.
Diagnóstico e tratamento
O diagnóstico do transtorno alimentar restritivo evitativo é realizado através de avaliação clínica detalhada, preferencialmente conduzida por um profissional de saúde especializado. “O uso de instrumentos padronizados de avaliação pode ajudar a descrever os sintomas e aumentar a confiança no diagnóstico, mas ele ainda é essencialmente clínico”, destaca a psiquiatra.