Ouvir rádio

Pausar rádio

Offline
MULHER NA LITERATURA: Chimamanda Ngozi Adichie
Literatura
Publicado em 10/03/2025

Chimamanda Ngozi Adichie

 

1.

Meio Sol Amarelo (MSA) é um romance belíssimo sobre sobrevivência, descoberta, escolha e manutenção de identidades em meio à guerra e à violência extrema.

 

2.

A estrutura narrativa tripartite de MSA permite olhar uma sociedade e as pessoas que nela vivem, com suas diversas características culturais e históricas, sobre prismas diferenciados, multifacetados e profundos.

O livro questiona o olhar simplista e os perigos de ver um povo, uma vida, uma cultura e mesmo uma guerra sob um único olhar .

 

3.

Ugwu, Olanna, Odenigbo, Kainene e Richard - os personagens centrais de MSA - não vão te deixar dormir sem lembrar de suas vivências, dores, aspirações e esperanças...

São todos inesquecíveis; mas Ugwu e Olanna são meus preferidos;

eu praticamente vivi e dormi junto com eles por duas semanas seguidas. ;)

 

4.

Nesta obra (MSA) nos deparamos com três personagens chave que são como "tipos ideais" escolhidos pela autora para tratar das consequências devastadoras da guerra: Ugwu é um garoto vindo de uma aldeia pequena e que condensa a tradição e a identidade da sua etnia;

Olanna é a nigeriana de classe média alta que estudou na Inglaterra e decide voltar para o seu país e participar ativamente de sua reconstrução e Richard é um inglês intrigado pela cultura e pela história nigerianas que não tem desejos de manter suas raízes e sim de criar novas. Mas é claro que estes personagens são muito mais;

a tentativa de tipificá-los não visa simplificar e sim entender o ponto de partida de Chimamanda.

 

5.

Todos estes personagens, bem como os demais de MSA, trazem à tona o conflito central do livro: as supostas fronteiras ou os limites entre o étnico, o nacional, o estrangeiro e o humano.

A delimitação de identidades através da origem, da história política e social, da ideologia e das crenças e valores;

contraposta à unificação do diferente através da humanidade, do amor e do perdão.

 

6.

Entretanto, essa temática (bem como a discussão de fundo de colonização e barbárie), por si só densa e difícil, aparece no livro de Chimamanda a partir da vivência de seus personagens e não de forma direta; o que torna a leitura muito, muito mais palatável, reflexiva e envolvente.

A guerra, a dor e o questionamento da realidade ganham carne e substância a partir dos dilemas e escolhas diárias de Olanna, Ugwu e Richard.

 

7.

Em nenhum outro livro que eu tenha lido recentemente vi os temas da fome, da guerra sem sentido e o da violência extrema serem tratados de forma tão forte, realista e, ao mesmo tempo, tão humana quanto em MSA.

A escrita, o enredo e os personagens de Chimamanda conseguem isso de uma forma única e muito interessante.8.

MSA também é muito interessante por outros recursos narrativos e pelos elementos históricos que recupera da guerra civil na Nigéria;

mas falar aqui sobre eles estragaria a experiência da leitura, o que considero imperdoável. 

 

9.

Chimamanda nasceu em 1977; tem 35 anos, é casada, mora parte do ano nos Estados Unidos onde leciona e outra parte na Nigéria e já publicou dois romances e um livro de contos.

(e eu também - apenas a parte de ter nascido em 1977, claro! Ano fantástico esse, hein? rs).

 

10. 

Hibisco Roxo (HR) é um romance primoroso onde a descoberta do amor, a vivência da dor e da incomunicabilidade se interpenetram em uma história belíssima.

 

11.

Em HR acompanhamos Kambili, uma jovem nigeriana de 15 anos, em sua jornada de profundas transformações no seu modo de perceber o mundo ao seu redor.

É o desabrochar de uma flor, mas não uma flor como as outras...

E sim uma flor rara e linda como o hibisco roxo.

 

12. 

Neste seu primeiro romance, Chimamanda não utiliza recursos narrativos variados: a narração em primeira pessoa de Kambili com o seu desabrochar para a realidade é o maior deles.

Fora isso, o enredo contribui bastante para cativar o leitor que tem em mãos novamente (de uma forma completamente diferente) a possibilidade de reflexão sobre os efeitos dramáticos da colonização na Nigéria, a devastação das tradições locais e suas consequências sociais e políticas (não tomadas no plano estatal, mas sim no plano individual;

ou seja, no que diz respeito às pessoas comuns).

 

13.

Ngozie, o nome do meio de Chimamanda, quer dizer abençoada.

(E Mercedes, o meu nome do meio, quer dizer "dar graças", perdão;

ou seja, outra coisa que temos em comum - Chimamanda é abençoada e eu dou graças por mulheres como ela no meu mundo ;)

 

14.

Ouso dizer que os livros de Chimamanda Adichie são como flores para a alma;

necessários para retomar em cada um de nós uma das questões mais profundas que nos deparamos ao longo da nossa existência - o que podemos fazer com o que recebemos na nossa vida, na nossa história pessoal?

O que queremos ser apesar de, ou melhor, independentemente do que as circunstâncias nas quais vivemos nos impelem?

Ou seja: para refletir sobre o que escolhemos ser, acreditar e como podemos agir no mundo ao nosso redor. Questionamentos estes que são inescapáveis e que eu quero me fazer e responder a cada momento em que elas se colocam na minha vida.

E quando a literatura me permite continuar pensando, elaborando e respondendo à estas e outras perguntas;

aí é que amo mais ainda esta arte única que é a de escrever estórias e agir através delas na história humana.

 

15.

Comecei a ler os contos de Chimamanda no livro The Thing Around your Neck e posso dizer que as grandes virtudes de sua escrita e seus eixos temáticos principais estão lá em cada história curta e, principalmente, na escolha de personagens e situações vividas.

Comentários